domingo, 20 de fevereiro de 2011

Entrevista desportiva - terceira parte


 A entrevista está disponível aqui.

Pinto Monteiro, para demonstrar o seu ponto de vista particular sobre a natureza política dos processos que envolvem políticos ( se fosse em Itália, teriam por lá um procurador-geral a confirmar as teses interesseiras de um primeiro-ministro que também acha que os seus processos são todos políticos, incluindo os de corrupção), fala num caso antigo que a esquerda de 1980 cavalgou intensamente e que de político tem tudo menos o de ser judicial:

"Lembra-se do processo que Sá Carneiro teve? As paredes cheias de "Sá Carneiro caloteiro?" Começou aí um sistema tremendo, com os partidos a quererem resolver questões políticas através de processos judiciais."

Claro que o jornalista desportivo, já não se lembra do caso. Se se lembrasse, recordaria ao actual PGR que o caso das dívidas de Sá Carneiro à banca não foi exactamente um caso judicial nem  tinha ligações a tal  assunto.
A informação que na altura foi "libertada" para o jornal da "verdade a que temos direito", o Diário do PCP, foi veiculada por fontes dos bancos, eventualmente sindicalistas ou militantes do partido que viram no caso uma ocasião para aproveitarem um facto desprestigiante para um político, no caso Sá Carneiro, e para o encostarem ao muro dos princípios da honestidade e verdade ética na condução dos negócios particulares que já vinham do período anterior ao 25 de Abril de 1974.
O caso foi exemplarmente tratado no O Jornal de 18.7.1980  e portanto o exemplo de Pinto Monteiro é uma perfeita mistificação: o caso não chegou nessa altura aos tribunais de modo a poder ser aproveitado politicamente através de violações de segredo de justiça, embora se possa questionar se não o foi através de violações de segredos bancários, em nome da "verdade a que temos direito".
Por outro lado, trazer este caso como exemplo de factos que não existiam  como sendo de interesse público  e do âmbito do tal "diz que disse",  com dignidade a serem relatados pelos media, é entender a opinião pública e a democracia em moldes muito suspeitos de carência de princípios.  E de uma leviandade que fica muito mal a um PGR, porque não corresponde ao sentido do que pretende dizer na entrevista. Quem não conhecer o caso, fica com a ideia que a saga e a sarna persecutória aos políticos por banda do "poder judicial", com apoio objectivo nos media,  começou aí.

Ora, só não começou aí como esse entendimento se torna muito perigoso numa pessoa que exerce o cargo de PGR. Mostra que uma pessoa assim, está disposta a desvalorizar tudo o que lhe pareça vir batido por ventos políticos de interesses precisos e de luta partidária. É isso aliás que tem vindo a lume nas intervenções do actual PGR, mesmo no âmbito do CSMP: os que estão contra ele, em certas questões, são do PSD. Já o disse, aliás.

Ora as coisas não são nem devem ser assim. Em nome do princípio da igualdade de todos os cidadãos perante a lei, os políticos devem ser investigados como se fossem cidadãos iguais aos outros e já bastam as excepções existentes a esse patamar de igualdade democrática e imperativa, para que ainda por cima tenhamos um PGR disposto a conceder mais créditos de excepção, com base em preconceitos contra o fantasma dos "processos políticos".
Um político não é um profissional da política, em sentido estrito. É acima de tudo um servidor da causa pública. Um servidor dos outros cidadãos. De todos e de nenhum em particular, muito menos dos seus correligionários.
Desculpar os políticos, acantonando-os num ghetto de isenção presuntiva de responsabilidades e vítimas do acosso dos demais cidadãos, particularmente os que lhe querem assaltar o posto, é tão nefasto como perseguir os políticos apenas porque o são.

2 comentários:

  1. "Quando se fecha uma porta, abre-se logo uma janela".
    Ainda bem que esta voz não se cala!

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  2. Que pérola: "O advogado rebateu ainda o último despacho de Noronha Nascimento, em Dezembro último, em que este voltou a negar o acesso de Penedos às escutas, invocando um acórdão dos tribunais superiores da Finlândia para salientar que os direitos dos arguidos de acesso às escutas não é absoluto. «Provavelmente o senhor presidente do STJ pensou que ficaríamos pelo que seleccionou e que não saberíamos ler o acórdão, em inglês, e esqueceu-se de dizer que nele também se diz que as escutas devem permanecer no processo até ao fim» -- ironizou."

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